Ano Novo não é como qualquer coisa nova. Quero dizer, não tão exciting quanto, por exemplo, um par de sapatos novos. Um corte de cabelo novo. Um novo perfume (francês ca-la-ro, sai de mim com boticarices e avonices). Um novo amor. Tá, aí já viajei na maionese alheia, nada a ver com a minha, esqueça.
Ano Novo, de novo mesmo, só tem o calendário. O resto é repeteco da vida de sempre. Então, como é tudo igual, let's think San. Meus pensamentos são os mesmos. Tão os mesmos que ontem tive um ataque massivo de deprê.
Diz o Neguinho Pessôa que é porque eu sou inteligente, o suficiente pra perceber que a vida é uma bosta, o mundo é uma bosta, velhice, morte, essas merdas todas (sic). E quem percebe tudo isso nitidamente, não tem como não ter ataque de deprê, de tempos em tempos, regularmente.
Não sei. Conheço gente bem mais inteligente que eu, que percebe tudo isso e não tem ataque de nada.
Acho que tem mais a ver com personalidade. A minha é gótica, adoro um sematary. Acho lindo, peaceful, acolhedor. Com garoa então, perfeito!
Gosto de me imaginar num belo e silencioso cemitério, cercada por lápides, anjos de pedra, mausoléus, árvores antigas. Eu andrajosa (morto pra mim anda meio estilo múmia, embora limpinho), meus alvos e ralos panos funéreos baloiçando ao vento, rosto muito branco, lívido mesmo, sorriso idem (não amarelo), sentada num túmbalo, conversando com outros mortos, saboreando um café Lucca, preto, sem açúcar, e bolinhos de banana açucarados, como Mamã fazia... Olha que soave!
E como nos lembraríamos de coisas acontecidas no nosso tempo de vivos! Riríamos das patuscadas, das fanfarronices, das aleivosias, dos deleutérios, dos oxicocos, das apóstrofes, dos campanários, das animosidades, dos almoxarifes, dos condados, das gônadas, dos almocreves, das opíparas, dos oblíquos, das cornucópias, dos abjetos, dos magarefes e dos obliterados, assim como das campânulas e dos apócrifos...
Como? Não viu lógica nisso? Por quem sois, mero vivente? A lógica é: viver morto é como viver em sonho. Pode tudo. Nada é impertinente, todas as ideias podem acontecer, sem explicação nenhuma. Tão bom!
Ontem então, estando eu a me debater no vórtice de meus pensamentos negríssimos de tormento, agonia, desesperança e coisas tipo "por que eu existo? ", "o que é a vida?", "pra que serve essa powha?", "qual o sentido dessa m toda?" etc, enquanto lutava comigo mesma pra sair de casa, ir à luta blablablá, pensava concomitantemente: "por que eu não lavo latrina pra viver?"
Imagine o seguinte: o quanto é feliz um lavador de latrina. E não sabe. Feliz por uma simples e irretorquível razão: ele não tem que pensar. Nada! O que você pensa enquanto lava uma latrina? No máximo: que merda! Mas isso eu já penso o tempo todo, de tudo. Supertranquilo.
Eu lavo latrina, pero domesticamente. Como diz meu teen, se bobear, lavo o banheiro todo, cada vez que vou lá. Verdade pura. Lavo com Omo líquido, que é inútil pra lavar roupa, mas é o rei dos bacanas pra lavar toda a casa, tem um cheirinho maravilhoso que até homi repara. Repare que eu disse até homi, citando a imbatível Vó Canda. Isso significa "é parrebentá". Que homi, em geral, só repara em limpeza de casa quando ela não existe, quando tá criando bicho (Vó Canda de novo).
Então pensava eu ontem: a maior ambição do homem devia ser ganhar a vida a lavar latrina. Exercício de desprendimento, humildade, zenitude. Além da satisfação excelsa de não ter que pensar. Nada a depender do seu raciocínio lógico ou artístico, se é que eu posso dizer isso. Decanso total, descompromisso, libertação.
Nada como lavar latrina. Enquanto você lava uma latrina pode pensar todas as bobájis e soavidades que seu çélebro deseje. Não faz mal. Diferente, por exemplo, de um médico. Quando o doutor está a auscultar um paciente, não pode pensar em nada bobo. Não pode fazer cara de sonso, dar uma risadinha idiota, nada disso. O paciente vai achar que o doutor tá de treta. Um engenheiro? Tem que ter só pensamento cartesiano, os demais, descarte. Um engenheiro que se preza passa o tempo pensando em π, λ, Δ, coisa que pra mim é Grego.
Forcei?
Enfim, lavar latrina. Ninguém chega pra um lavador de latrina e pergunta: "Escutaqui, meu filho. Tu despachou o malote pra Logística e enviou cópias da ata da assembleia do secretariado pro Financeiro? Como não? Sabe o que acontece se tu furar o prazo???" E neguinho começa a tremer nos joelhos e suar na testa, porque tem culpa no cartório.
Nada disso acontece ao lavador de latrina. Começa que ninguém cobra nada dele. O máximo que acontece é o cara chegar no reservado, ver aquela latrina toda ferrada e dizer: "PQP! O FDP do Ari comeu feijoada no bufê, de novo!" Nem quer saber se o lavador já passou ou ainda não chegou. Tranquilis.
Well, não estou sendo sincera. Faltou um detalhe importantíssimo: pra ser ideal, o emprego de lavador de latrina só precisava ser bem remunerado. Tipo: quanto mais podre o lugar, mais alto o salário. Aí sim. Resumindo: o maior salário do país devia ser pago a quem lava latrina no Congresso. La merde de la merde, zifio.
Bem, então ficamos assim: nada lhe desejarei de bom pra este novo ano, que já não lhe tenha desejado nos anus anteriores. Valeu?
Pero sí, el único que te puedo desear es que no se acabe el mundo el 21 de deciembre de 2012.
De verdad, según el epigrafista Sven Gronomeyer, de la universidad de Trobe (Australia), las predicciones Mayas no aluden al fin del mundo, sino al final de una era y comienzo de otra, cuando regresaría Bolon Yokte, un diós vinculado con la creación y la guerra.
Meno male. Que venha o Bolon, entonces. Tá bom assim? Olha, melhor do que isso acho que não posso desejar a ninguém, pelo menos não a quem queira continuar vivo nesse mundinho podre.
Taí, viva!
E viva o Bolon! 2012, um ano à Bolonhesa.
Até de repente, ainda em 2012.
Bjuxxx reveiônicos.