quarta-feira, 18 de abril de 2012

Nao admire demais



Nao admire demais a alguém, nao admire ninguém demais.
Nao ache grandes áfricas.
Nao veja as qualidades de uma pessoa através da lupa do teu entusiasmo.
Nao se deixe fascinar, nao se devote.
Só Deus merece a tua devoçao. Ou nao. Mas nunca o homem.

Nao ache alguém tao esperto, ou doce, ou sábio, ou generoso, ou inteligente, ou dedicado, ou capaz, ou talentoso, ou afortunado ou feliz, ou bom, ou bonito, ou isso ou aquilo.
Ninguém é o que te parece.

Pois o que te parece, nao parece pra mim ou pro teu vizinho,
porque tudo nesta vida é absolutamente relativo.
Cada um de nós projeta sobre o outro uma imagem que nao é a verdadeira,
e nem é a imagem que um terceiro verá.
É tudo ilusório, e a ilusao depende, muitas vezes, diretamente do nosso fígado ou do nosso calcanhar [de Aquiles], ou de como funcionaram os nossos intestinos, de véspera.

Conheci algumas poucas pessoas nesse mundo, a quem admirei demais e por longo tempo.
Pessoas com talentos distintíssimos, habilidades admiráveis, cérebros privilegiados
que todos aplaudiam e gloriavam, vidas privilegiadas, que todos invejavam.

Todas essas pessoas - eu disse TODAS essas pessoas - eu soube depois, tinham o seu lado negro.
Umas mostraram violência, outras prepotência, outras preconceito, outras fraqueza, outras loucura, outras idiotice, nao importa o que, mas sempre sempre sempre uma característica tao humana quanto irracional quanto insuportável quanto destruidora de suas qualidades outras.

E eu, invariavelmente, voltava sozinha aos meus pensamentos, aos aposentos dos meus sonhos, a me refugiar na minha grande, limpa e aconchegante queen, buscando a consoladora posiçao fetal, lembrando os tempos de criança, quando eu olhava um adulto de baixo pra cima, e o achava ameaçadoramente alto e grande, e desnecessariamente terrível, um falso Deus irado.

Todo mundo, chega uma hora, se prova um cretino. É nisso que eu acredito.

Porém, nao vos enganeis, pensando que eu me acho uma jóia rara entre esses pedregosos.
Eu me acho uma bosta. Meus amigos é que sao todos príncipes, aquela história.
Mas ser uma bosta nao quer dizer que eu deva admirar outras bostas.
Nao quero, nao preciso, nao vou.

Deu pra minha cabeça. Chega de caraminholas.
O caminho está livre pra quem quiser se ajoelhar, prosaicamente, ante meus abandonados ídolos de barro, de ouro, de matéria onírica ou fecal.

Estejam à vontade.
Mas quando os descobrirem grosseiramente imperfeitos e enfadonhos, rasteiramente comuns e perplexantes, lembrem-se deste meu precautionary statement.
Tomem um Nescau Light morninho, escovem os dentes e vao dormir.
Que provavelmente já irá alta a madrugada, e suas pálpebras estarao pesadas de sono e decepçao com a vida e com os viventes.

4 comentários:

  1. Tanta lu(z)cidez num petit post(e)!vou imprimir e dar pro filho ler, colar na parede da porta pra ler de vez em quando, essas vezes que a gente se acha uma bostinha ou das outras em que a gente se acha o contrário, uns puta cara fudido! até vou colocar no meu bloguis, que eu sou bem cretina tbm, copio e colo coisas que eu quero dizer mas nem o faço porque já o fizeram por mim...
    bj

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  2. Maravilhosa e terrivelmente real. Quando o eu resolve projetar um ser angélico, coitadinho do outro! Quero crer que, desencantado o desencanto e destravada a perplexidade, olhando bem, fora do pedestal as pessoas possam ficar até mais interessantes. O Caetano Veloso cantou algo parecido com "o rei é mais bonito nu".

    beco prado

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  3. é por isso que eu "gosto" do Darth Vader... ele não esconde o "lado negro"!

    SIPZ, muito apropriadas suas palavras. Se for para admirar alguma coisa ADMIREM OS BICHOS, a organização das formigas, o espírito comunitário das abelhas e blá blá blá.

    VIVA OS PANDAS!

    JOPZ

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