Moro no Centro Cívico. Um lugar que se pensa, no mínimo, cívico, civilizado, coisa do gênero. Ledo ivo engano. Isso aqui é tão bas-fond como qualquer lugar bas-fond do mundo. Hoje em dia é tudo bas-fond. Parece que não sobrou outra coisa. Esse mundo já estava pedido quando Vó Canda era mocinha.
Quisera morar numa penthouse assim. Só com quem eu quisesse. Maravilha!
Ou até podia ser com vizinhos com cachorros. Que eu atiraria, alegremente, lá de cima. Yay!
Tenho a felicidade de ter os seguintes vizinhos:
1 - alienados com malditos insuportáveis cachorros latidores, em 90% dos apartamentos;
2 - velha desgraçada, com púdol desgraçado histérico latidor, no prédio ao lado, enorme janela da sala, onde a velha desgraçada deixa o púdol desgraçado a latir, dando pra minha enorme janela da sala, em sensurround;
3 - pobre rapaz com problemas mentais, altercando diuturnamente com mãe com mais problemas mentais que ele, a qual vocifera o tempo todo de um modo agônico, deixando a impressão que está na iminência de acabar de vez com a cria mal sucedida, desferindo-lhe cadeirada fatal e redentora nas fuças;
4 - moçoilas alegres que chegam embaladas da balada, equilibrando alto teor etílico sobre altos saltos desgovernados, sempre esquecendo o código de entrada, em virtude do que interfonam, aos altos brados retumbantes, pra que algum desgraçado lhes abra o portão;
5 - rapazes bem dispostos, que aproveitam as viagens dos velhos pra trazer ao apê moçoilas alegres e embaladas, que liberam às cinco da manhã, com alto teor etílico e altos saltos desgovernados, além de muitas gargalhadas e palavras não recomendáveis em ambiente familiar, sobre o rendez-vous;
6 - cidadãos risonhos, pacatos e folgados, que interfonam pra você lá pelas tantas, pra alegremente anunciar que o filho chegou da pqp, e vai parar carro na sua vaga na garagem, que no momento é a única livre, mas que assim que você precisar dela de volta, é só interfonar que ele retira o carro de lá, certo?
7 - bruaca mal amada horrorosa e solitária, que te vira a cara sem quê nem porquê, e passa os dias inúteis da vida a bolar um modo de te azucrinar com coisas absurdas, que nunca servem pra nada, a não ser te azucrinar;
8 - casal de velhos no apê de cima, que passa todos os feriados e fins de semana pajeando tropa de netinhos corredores, puladores e gritadores, cujo passatempo principal é rolar alguma coisa pelo chão, cujo som sugere uma bola de canhão, para o gáudio dos avós babões, surdos e despreocupados com o direito ao sossego do vizinho de baixo;
9 - mulher chorona e atormentada, cujo marido, ao que parece, tem uma amante, e que dá notícia disso volta e meia, gritando para o dito: "desgraçado! tem uma amante, é? pois todo mundo vai saber disso agora!" E o mundo fica, dessa forma, sabendo;
10 - cornudo de meia idade que, munido de uma tosse severa e um pileque idem, resolveu passear hoje de madrugada pelos jardins do prédio, a maldizer, sob a garoa, sua triste sina. E - obviamente - a tossir feito louco.
Isso sem mencionar a plêiade de peões falastrões, gritalhões, breganejões, que estrelam obras perpétuas, por vezes, inúteis. Como a rampa para cadeirante, construída num ângulo empinado de 45 graus, que depois de pronta, mostrando-se impraticável, foi "consertada" para uns 30 graus! Rampa que, aliás, leva a um saguão de apês só acessíveis por escadas... Devia-se agora construir no saguão um parlatório, pra justificar a rampa. Isso se algum herói conseguir vencer a mesma, empurrando um cadeirante, magrinho que seja. Ah, e sem toldo ou coisa que o valha. Imagine com chuva, o ato de bravura.
Que tal? Mundo de imbecis!
Depois sou eu que não tenho paciência com os outros, sou eu a Nervosa...
É ou não é?